(www.multirio.rj.gov.br/portal/riomidia)
4/16/07, gabriel guimard
Pode-se dizer que a jornalista Josy Fischberg, editora-assistente do Globlinho, suplemento infantil do jornal O Globo, tem conseguido aliar a prática de sua profissão com o respaldo acadêmico. Josy acaba de defender sua dissertação de mestrado (Criança e jornalismo: um estudo sobre as relações entre crianças e a mídia impressa especializada infantil) no curso de pós-graduação de Educação (PUC-Rio).
"Minha vontade era compreender de que forma as crianças, que vivem em uma época tão marcada pela força incontestável da televisão, a mídia audiovisual, constituída por imagens em movimento e som, se relacionavam com uma mídia impressa, estática, constituída por textos corridos, fotografias e imagens", explica Josy.
Foram entrevistadas 59 crianças de duas escolas da cidade do Rio de Janeiro. Para a maioria, os jornais impressos são feios, soltam tinta, trazem textos grandes e não são nem um pouco atraentes e coloridos. "As observações dos meninos e meninas não são certas nem erradas, mas não são à toa. Para essa meninada, o jornal é uma coisa chata, mas, ao mesmo tempo, ela credita valor à publicação. As crianças acham que o jornal é fonte de informação, que é algo muito importante", revela Fischberg.
Na sede do jornal O Globo, Josy concedeu a seguinte entrevista ao RIO MÍDIA:
RIO MÍDIA - O que a motivou a estudar a interface entre as crianças e os suplementos infantis?
Josy Fischberg - O desejo surgiu da inquietação de uma repórter. Durante os anos de 2003 e 2004, uma de minhas funções na redação do jornal em que trabalhei, O Globo, era escrever para o seu suplemento infantil, o Globinho, um caderno editado semanalmente e destinado a um público com idades entre 8 e 12 anos. Escrever, neste caso, não significava apenas redigir. O trabalho ia desde a busca e sugestão de assuntos e temas que fossem do interesse das crianças leitoras, passava pelas entrevistas e fotografias que fazíamos "na rua", em bom jargão jornalístico, e tinha, como etapas seguintes, a redação do texto, sua diagramação ao lado das imagens pertinentes e, enfim, a publicação da reportagem. Pois era o ponto final do processo descrito que, de certa forma, me incomodava. Enquanto a maioria dos jornalistas se preparava, findo o trabalho, para dar início a um novo processo - sugestão de pauta/apuração/redação -, meu maior desejo era, na verdade, partir para a casa de meus leitores de pouca idade e entrevistá-los, no intuito de saber o que pensavam sobre o material que produzíamos. Procurei então o curso de pós-graduação em Educação da PUC-Rio.
Ao ingressar no curso de mestrado, me desliguei oficialmente do jornal, embora tenha continuado a escrever esporadicamente. Com este trabalho, busquei realizar um estudo sobre as interações entre crianças e os impressos jornalísticos, em especial aqueles voltados para o público infantil. O objetivo era compreender de que forma as crianças, que vivem em uma época tão marcada pela força incontestável da televisão, a mídia audiovisual, constituída por imagens em movimento e som, se relacionavam com uma mídia impressa, estática, constituída por textos corridos, fotografias e imagens.
RIO MÍDIA - E o que foi que você constatou?
Josy Fischberg - Antes de tudo, é preciso frisar que não podemos generalizar os resultados. Trata-se de uma pesquisa qualitativa que envolveu crianças de um determinado contexto socioeconômico e cultural, de uma determinada realidade. Foram entrevistadas 59 crianças, divididas em três grupos: dois pertencentes à escola pública (alunos entre 11 e 16 anos, matriculados na 5ª série) e um terceiro ligado à escola particular (alunos entre 10 e 12 anos, matriculados na 5 e 6ª séries). Convivi três meses com os estudantes realizando oficinas. Logo de início, constatei que a televisão e a internet exerciam, sem sombra de dúvida, um maior fascínio e estavam muito mais presentes na vida das crianças do que o jornal e as revistas. Para as crianças, as publicações eram feias, soltavam tinta, traziam muitos textos grandes e não eram atraentes nem coloridos.
Na avaliação das crianças, o jornal deveria ser encadernado em espiral e tinha que ter cor, como a televisão. O apelo do audiovisual é muito forte para os usos e os desusos que as crianças fazem do impresso. Não tem mais como se desvencilhar disso. Segundo os estudantes, o jornal deveria ter mais coisas divertidas como a televisão tem.
RIO MÍDIA - Você ficou surpreendida com estas observações?
Josy Fischberg - Desconstrui algumas percepções que tinha. Temos, por exemplo, uma visão de que as crianças gostam apenas de coisas de criança, como literatura infantil, apresentadores de programas infantis e outros diversos produtos que enquadramos para a sua faixa etária. Mas a realidade não é bem assim, pelo menos ao analisar este grupo. As meninas e os meninos gostam de coisas do mundo adulto, mas que, na prática, são coisas que estão ligadas tanto ao mundo adulto quanto ao universo das crianças dos dias de hoje. Nós é que achamos que existe esta divisão. Elas não. Assim como os adolescentes e os adultos, as crianças gostam de moda, de novela, de esporte...
O que surpreende também é que, quando os assuntos são interessantes, as crianças não se importam com o tamanho do texto da matéria. Elas lêem com prazer e sem nenhuma dificuldade, não acham o texto difícil. Se o assunto for interessante e tiver a ver com o seu dia-a-dia, a criança vai ler a reportagem independente do tamanho da matéria, da foto ou até mesmo da diagramação.
RIO MÍDIA - A pesquisa fez você repensar sua atuação como jornalista que escreve para crianças?
Josy Fischberg - Com certeza. Defendi a dissertação em março passado. Nesse meio tempo, fui convidada para voltar para o jornal O Globo, para trabalhar, desta vez, como editora-assistente do Globinho. Depois de vivenciar esta pesquisa, aprendi algumas coisas e reformulei alguns pontos. Hoje, quebro muito mais a cabeça para pensar e produzir uma pauta do que antes. Um exemplo bem prático é a forma de escrever. Antigamente, meu texto fazia muitas perguntas para o leitor, para a criança. Era como se eu quisesse dialogar com ela. Mas durante o estudo vi que isso não é tão necessário. Isto não faz diferença. A criança, pelo que pude ver, vai ler se quiser, se o assunto for do seu agrado, se despertar algum interesse. Você não precisa, no texto, ficar chamando ou instigando a criança. Hoje, percebo que, de certa forma, acabava infantilizando o texto, a maneira de escrever.
RIO MÍDIA – Você acha que estamos presenciando, cada vez mais, a antecipação da vida adulta das crianças?
Josy Fischberg - Não gosto de falar em antecipação da vida adulta. Penso que elas vivem num mundo diferente do que a gente viveu. Elas não são adultas. Apenas têm mais informação. Não sou tão pessimista como alguns teóricos que apontam que a infância morreu. Essas crianças têm, na prática, uma infância diferente. São crianças num mundo diferente. Cabe a nós entendê-las. Entender o raciocínio e o pensamento desta geração que tem um mundo diferente para explorar.
RIO MÍDIA - Quais são os temas abordados pelos jornais que mais agradam as crianças? Há diferença quanto ao gênero?
Josy Fischberg - As crianças não têm muito costume de ler jornal, embora suas famílias comprem ou assinem as publicações. Os responsáveis pelos alunos da escola pública geralmente liam os jornais cariocas Extra e Expresso. Os da particular eram assinantes do jornal O Globo. Pelo que verifiquei, as crianças lêem com mais freqüência revista. Os meninos gostam daquelas que falam sobre jogos eletrônicos. Já as meninas, publicações como Capricho, Caras e Contigo. Todos lêem também, de certa forma, revistas infantis, mas é esporádico. Um detalhe interessante é que as meninas, sem nenhum tipo de problema, se interessam pelos assuntos dos meninos. Mas o contrário não acontece: os meninos se recusam a se misturar, ceder, conversar ou partilhar. Com relação ao jornal, tanto meninas quanto meninos se interessam por matérias que envolvem celebridades, matérias sobre fofocas. Não gostam de reportagens sobre economia e política.
RIO MÍDIA - Se eles pudessem refazer o jornal, o que eles modificariam?
Josy Fischberg - Eles mudavam o aspecto físico, utilizando o papel revista e colocariam mais fotos e cor. Quanto ao conteúdo: textos mais curtos, embora eles leiam, como já disse, o que desejam e não se importam com o tamanho. Eles desejam ler também matérias mais legais e positivas. Afirmam que não gostam de ler sobre a violência. Mas é um tema recorrente quando conversamos sobre a cobertura de jornal. Eles não gostam de ver nem de ler tais assuntos, dizem que faz mal. Mas, ao mesmo tempo, se interessam por eles.
RIO MÍDIA - Diante de sua pesquisa, qual é o papel de um suplemento infantil?
Rosy Fischberg - Apresentar o jornal de forma mais palatável possível já que as crianças, de certa forma, não gostam da publicação. As observações que elas fazem do jornal não são certas nem erradas, mas não são à toa. Para essa meninada, o jornal é uma coisa chata, mas, ao mesmo tempo, ela credita valor à publicação. As crianças acham que o jornal é fonte de informação, que é algo muito importante. Isso é muito bom!
RIO MÍDIA - Como você avalia o espaço que a grande imprensa escrita dedica às crianças?
Josy Fischberg - Os jornais estão se dando conta da necessidade de conquistar o público infantil e de saber como lidar com ele. Acho que há pouco espaço para as crianças nos jornais. A maioria não tem nenhuma proposta ou suplemento. No caso do Rio de Janeiro, apenas o jornal O Globo tem um projeto neste sentido. Mas acredito que as empresas estão estudando, estão pesquisando uma fórmula de fazer um produto de qualidade para um público que é bastante exigente.
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