28 de janeiro de 2003

LEI 10.639 INCENTIVA EXPERIÊNCIAS DE PROFESSORES DA REDE PÚBLICA

www.acaoeducativa.org.br

Especialistas acreditam que ensino médio pode ser espaço privilegiado para implementação da Lei, mas advertem que não pode ser lócus exclusivo.

Ainda que tenha poucos anos de vida, a Lei 10.639/2003 - que obriga escolas de todos os níveis de ensino e da rede privada e particular a incluir no currículo escolar temas relacionados à história da África e da população afro-brasileira - tem incentivado a realização de algumas boas experiências por parte de professores e professoras brasileiros. Esta é a opinião de algumas pesquisadoras consultadas pelo Boletim Juventude na Cena, que também fizeram um diagnóstico sobre como a lei tem influenciado as práticas do ensino médio, onde predominam adolescentes e jovens.

Criado em 2001, o Prêmio Educar pela Igualdade Racial, iniciativa do CEERT (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade), foi pioneiro no incentivo e apoio de iniciativas educacionais dirigidas à promoção da igualdade racial. Em sua primeira edição, a premiação contou com 210 inscrições e, em sua última, com quase 400 inscritos.

Júlia Rosemberg, coordenadora do programa de educação do CEERT, atribui esse crescimento a vários fatores: credibilidade e reconhecimento da premiação e a existência de parcerias em todo o Brasil. Entretanto, o aumento em 25% da terceira edição em relação à segunda pode ser entendido como resultante do impacto da implementação da Lei 10.639, o que tem incentivado professores e professoras a apostarem na temática. “Não se trata mais de uma escolha dos profissionais e sim de obrigação e compromisso”, comenta.

Das inscrições para o Prêmio, há predominância de iniciativas desenvolvidas no Ensino Fundamental II (equivalente à 5a à 8a série) e do ensino médio. Em sua terceira edição, juntas, as inscrições de iniciativas desses níveis de ensino corresponderam a 66% das inscrições. “A partir da análise do material que recebemos, ficou nítido que as disciplinas da área de humanas são as que mais abordam a temática das relações raciais. Isto, infelizmente, contribui para perpetuar a falsa idéia de que a África e seus temas correlatos devem ser exclusividade dos professores de história e geografia”.

Ensino médio – Ana Lúcia Silva Souza, doutoranda, professora da Faculdade Hoyler de Pedagogia e assessora da Ação Educativa, acredita que, apesar da necessidade de se implementar a Lei em diferentes níveis de ensino, o ensino médio é um espaço urgente para o diálogo sobre as relações raciais no Brasil. “É o último momento de escolarização desses jovens; depois, eles caem no mundo! Esse grupo é aquele que transitou pela escola e por outros espaços e foi aos poucos silenciando a questão. É importante um processo de enfrentamento do silêncio”, afirma.

Para isso, ela considera importante lançar mão de várias iniciativas. Uma delas seria a aproximação com grupos e organizações de juventude que possuem práticas e estilos conectados à idéia de negritude – como é o caso do movimento Hip Hop. “São procedimentos importantes para demonstrar a presença da cultura negra”. Mas para a pesquisadora, essas não devem ser as únicas estratégias: “são importantes, mas não são exclusivos. Isso é restringir o campo de ação da escola”.

Ana Lúcia faz ressalvas e indica possibilidades de abordagem sobre a temática no ensino médio. Ela alerta, por exemplo, que se não forem consideradas questões importantes para a vida dos jovens, incluir mais um tema no currículo pode não produzir os efeitos desejáveis de maneira satisfatória. Além disso, acredita que trabalhar com a noção de preparar os jovens para o futuro é incorrer numa idéia equivocada de que os jovens já não se deparam com dilemas raciais em suas vidas. “Por exemplo, quais são os arranjos e preparativos que jovens negros fazem para irem ao cinema, entrar em lojas e procurar emprego? A discussão sobre essas estratégias é um bom começo de trabalho em sala de aula”.

Temas como os traços corpóreos, formação profissional, carreiras e trajetórias de trabalho e relacionamentos afetivos são candentes nesse momento da vida, segundo Ana Lúcia, e podem ser abordadas no currículo escolar, envolvendo uma quantidade significativa de disciplinas e conhecimento. “O que as estatísticas, os dados censitários e a própria história do Brasil denunciam são trajetórias distintas para negros e brancos pelas profissões e no mercado de trabalho? Por que o cabelo de negros é diferente dos de brancos, e outros traços? São questões que podem mobilizar a produção de conhecimento em diferentes disciplinas”, argumenta.

Ações do governo – O Ministério da Educação, por meio da Secad (Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade), tem lançado mão de iniciativas que visam o apoio aos profissionais de educação: publicação de livros, apoio a projetos, cursos, fóruns permanentes, entre outros.

Para tratar do assunto de maneira adequada com crianças, adolescentes e jovens – considerando assim suas especificidades –, em 2005 a SECAD publicou em 2005 o livro “Orientações e ações para a educação das relações étnico-raciais” que, além de apresentar artigos de especialistas, oferece subsídios para o trabalho docente nos diversos níveis e modalidades de ensino (o livro está disponível para download em www.mec.gov.br/secad/diversidade/ci). Especificamente sobre o ensino médio, há ainda o volume 6 da Coleção Educação Para Todos, que traz como temática ‘Mercado de trabalho, religiosidade e educação quilombola’ – também disponível no endereço eletrônico.

Nenhum comentário: